07 março, 2015

Vida de Pombo

Boa tarde, minha gente!
Me desculpem, por favor.
Atrapalho seu silêncio
E nem vou falar de amor.

Agradeço ao motorista!
Proibiram a minha Kombi
Ele bem sabe o que eu queria.
É só ter um uniforme.

Minha mulher é diarista
Varre chão
Faz milagre no fogão
Não com a lista da patroa
Mas em casa, 
com três filhos e uma broa.

Sei comé que isso sôa:
"Lá vem mais um João
Falar da vida, aí à toa.
Pra no final, pedir mais pão."

Eu sou pobre, sim, senhor.
E com nenhum orgulho!
Trabalhei a vida inteira
Implorando por mais entulho!

Já pensei em muito atalho
Pr'essa tortura ter fim.
Vender bagulhoassassinato...
Preferi o moedor de alho.

Vivo de bico...
Quebrando um galho ou outro
num posso fazer bico
Sem ter onde cair morto!

Quem pega bonde, sem conforto
E ainda olha o próprio umbigo:
Eu já desço ali no Horto.
Seu tempo, em breve, será devolvido.

Num to dizendo que você deva ouvido.
Mas, por favor, preste atenção.
Não carrego droga, arma,
Bala Halls, nem pirulito.

Hoje só vendo minha lábia
Hoje não quero seus trocados
Abram seus olhos! 
Se sintam tocados!

Não se escondam atrás da covardia!
   Sou preto, dá pra ver.
Mas num vô me de-pra-var!
Sou só de cor! Não de uma cor vadia!

Tenho fome... Quem não tem?
Cês tem fome, é "vou pra casa".
Tenho fome, é "passar bem."

Um frango de padaria...
Puxa! O que eu não daria.
Só não dou braço, nem perna
Porque amanhã vou trabalhar!

O padeiro lá da comunidade
Dava pra mim, de caridade 
Os pão que passava do ponto
Queimavam, engrossavam...
Mas lá em casa, alimentavam uma cidade!

Mas, enfim, depois eu conto.
Mais um pouco dessa vida de pombo.
Comer migalha, cagar migalha...
"ô motorista, esse é meu ponto!"




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